sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

É então isto para crianças? — Parte V: let's look at the trailer.

Amanhã começa a segunda edição do festival Play. À sessão de abertura, às 17h30, no S. Jorge, vou levar o A., que, aos 8 anos, tendo já passado a fase de assinalar as diferenças, atravessa o momento de aprender a aceitá-las. O filme espanhol Floco de Neve parece-me perfeito neste contexto:




Mais destaques do primeiro dia do Play estão na página do Facebook do festival e aqui:


A programação do Play pode ser consultada aqui.

Um deles é o filme Papel de Natal, do José Miguel Ribeiro, a escolha do cineasta para partilhar no colóquio "É então isto para crianças?".




Sobre ele, disse-me o José Miguel: "Este filme claramente nasce de uma consciência de que alguma coisa tem que mudar. E, se queres mudar o mundo, começa pelas crianças. (...) a nossa mensagem introduz-se um bocadinho na consciencialização de que vivemos numa casa que tem paredes, tem limites, e nós temos que cuidar dela. É essa consciência de que, quando fazemos um gesto, e no filme isto está mostrado, podemos alterar o mundo."

Papel de Natal recupera uma das minhas personagens preferidas do cinema de animação português mais recente: Dodu, o rapaz de cartão


Há muitas outras, para descobrir no dia 9 de Fevereiro, na Gulbenkian, tendo como guias o Afonso Cruz, o Fernando Galrito (e o festival Monstra está quase a chegar!) e o João Paulo Cotrim, numa mesa moderada pela Filipa Leal.




Deixo-vos só mais duas — duas meninas. A de História trágica com final feliz, filme da Regina Pessoa



e a menina de olhos a piscar de Sem Querer, imaginada pelo João Fazenda e pelo João Paulo Cotrim para aquele que foi considerado o melhor filme português no 35º Cinanima. Podem espreitar o trailer aqui.

Se é então isto um filme? Dois filmes? Sem dúvida. Se são filmes para crianças? Dia 9 de Fevereiro, podem perguntar aos autores. A mim, deixam-me o coração a bater depressa e os olhos azuis a piscar. PIM!

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

É então isto para crianças? — Parte IV: O que faltava acontecer.


Falar de espectáculos para a infância e a juventude em Portugal é falar do trabalho da Madalena Victorino, que criou, no CCB, o primeiro espaço nacional "de fruição artística internacional para um público jovem". Foi lá que conheci o trabalho da própria Madalena, assim como o do Fernando Mota, sobre quem escrevi recentemente aqui (e que é o inconfundível responsável pela banda sonora do espectáculo que motiva este post), e o da Aldara Bizarro. 

Todos eles vão passar pelo colóquio É então isto para crianças?, onde a Aldara, num depoimento filmado, partilhará o espectáculo "A preguiça ataca", criado precisamente no seguimento de uma encomenda da Madalena Victorino para o CCB. À mesa com a Madalena estarão sentados o António Jorge Gonçalves (sobre quem tantas vezes já aqui escrevi), a Patrícia Portela e a Susana Menezes, numa conversa moderada pela Clara Caldeira, que contará ainda com outro depoimento, da Maria de Assis Swinnerton, directora do programa Descobrir da FCG.


A segunda mesa do dia 10 de Fevereiro do colóquio
"É então isto para crianças?"


Hoje de manhã, eu e a Clara fomos ao Dona Maria ver "À espera que volte", um projecto educativo do Teatro do Montemuro dirigido à comunidade escolar. Contou-nos a Ana Ascensão, do TNDM II, que a peça foi criada para ser mostrada nas salas de aula das escolas da zona da Serra de Montemuro, uma vez que são poucas as salas de espectáculo dessa região. As salas de aula foram, assim, transformadas numa espécie de nuvem-laboratório, se os cenários se tiverem assemelhado ao que estava hoje montado na sala-estúdio do D. Maria, com duas filas preenchidas por alunos de uma escola lisboeta que misturava meninos e meninas de várias idades, raças e etnias.


Imagem retirada daqui.

Eu e a Clara éramos, pois, duas peças fora do baralho daquela turma que começou por se  juntar no hall do Teatro Nacional para que Piotor, um homem forte e bom que trouxe da Rússia a história de uma gota de água, pudesse recrutar sete crianças para a peça, encenada pela Madalena Victorino (o texto foi criado com Paulo Duarte, que interpreta — maravilhosamente, sublinho — Piotor). 

Naqueles instantes no hall — eu e a Clara sentadas num sofá, os meninos à nossa frente, olhando-nos de vez em quando como quem pergunta "E aquelas duas? Não saem dali? São como o busto do Garrett?!" —, lembrei-me imediatamente não apenas da dimensão humanística do trabalho da Madalena (reforçada depois pela história da peça e pela interpretação do Paulo Duarte, que levanta um menino no ar, que narra com a voz e com o corpo, que — generoso  — integra, inclui, convoca...), mas também do modo como, no seu trabalho, envolve sempre a comunidade, o público, gente de todas as idades e de todos os cantos. Ocorreu-me ainda o título que a Madalena escolheu para o breve texto que sintetiza os aspectos que vai abordar no colóquio "É então isto para crianças?": "Um espectáculo pode ser aquilo que faltava acontecer entre uma criança e um adulto".

"À espera que volte" tornou-nos pares e, por isso, pareceu-me aquilo que faltava acontecer entre os alunos daquela turma e os seus professores; pareceu-me aquilo que faltava acontecer entre aquelas quatro meninas e aqueles três meninos, em 10 minutos transformados nos mais competentes e empenhados "pequenos músicos russos" que alguma vez vi, e aquele actor; pareceu-me aquilo que faltava acontecer entre as pessoas sentadas ali, nas cadeiras da sala-estúdio, e Piotor, o russo que se instalou na nossa memória e desafiou a nossa imaginação. Em suma: pareceu-me aquilo que faltava acontecer na minha manhã. No meu dia. PIM!

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

É então isto para crianças? — Parte III: Fernando Mota, sons e palavras para todas as infâncias.

Ontem, chegaram-me, pelas várias caixas de correio que costumo abrir diariamente, duas belas notícias: 

. uma é a de que o colóquio "É então isto para crianças?" já tem e-card (partilhem, partilhem!);


Imagem de Ana Ventura.


. a outra é a de que o Teatro São Luiz conseguiu mais espaço para o espectáculo Photomaton — Divertimento para viola portuguesa e mala preparada, do genial e sempre surpreendente Fernando Mota. Ou seja, há mais bilhetes para os espectáculos de sábado, às 16h, e domingo, às 11h (corram, corram!).


Imagem retirada do site do São Luiz.
Mais aqui.

Há uns anos, vi um espectáculo do Fernando Mota chamado Motofonia. Foi o subtítulo que me conquistou: "Um solo poético para todas as infâncias". Arrastei o F., o A. e a minha mãe. As nossas infâncias coincidiram, de repente, enquanto assistíamos a momentos assim:




Desde esse primeiro espectáculo que o Fernando criou para a infância, fiquei atenta ao seu trabalho e, quando surgiu a hipótese de comissariar o colóquio "É então isto para crianças?", foi um dos primeiros nomes de que me lembrei. Queria mostrar uma criação do Fernando e, por isso, pedi-lhe que escolhesse ele um dos seus espectáculos, para comentar e para partilhar com quem passar pela Gulbenkian nos dias 9 e 10 de Fevereiro (recordo que o mote do colóquio é a partilha). 

O Fernando escolheu as Canções Nómadas, criação que foi mostrada no CCB em Junho do ano passado. E o seu depoimento integrará a conversa "É então isto uma canção?" (dia 10 de Fevereiro, das 10h às 12h30, na Gulbenkian).




Sobre estas Canções Nómadas, nas quais participam também o Rui Rebelo e a Carla Galvão, disse-me o Fernando que são "uma viagem por canções em várias línguas, em vários continentes, em vários países. É um hábito que temos em vários espectáculos, o de incluir outras línguas, até línguas que nós não percebemos. Achamos que é uma acção social e política para ter com as crianças, a de habituá-las a outras realidades, a outros contextos, a outras culturas. E de abordá-las da perspectiva do fascínio, não do medo. Do fascínio pelo diferente, pela novidade, pelo outro." 

Só isto bastava para justificar aqueles dois adjectivos que usei linhas acima para descrever o Fernando: "genial" e "surpreendente". Só isto bastava para haver quem, ao ler estas linhas, esteja já a correr para o S. Luiz para conseguir os últimos bilhetes do Photomaton

Eu tenho três: o meu, o do F. e o do A., que, quase quatro anos depois de Motofonia, aguardam o reencontro com uma criação do Fernando. PIM!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Uma coisa em forma de espanto.

Um dos poemas do meu primeiro livro de poesia, As Coisas (ed. Abysmo), termina com este verso: "como uma coisa lenta em forma de espanto". O espanto sempre foi, para mim, uma hipótese de abrandar, uma hipótese de reparar, uma hipótese de regressar. 

Até que levei o meu sobrinho A. ao Espaço de Mulheres (Clube Estefânia) para ver comigo a peça que a minha amiga Ana Lopes Gomes protagoniza: O Mundo das Cores (texto de Pedro Cavaleiro, encenação de Isabel Medina). Foi então que o espanto ganhou a forma de um balde encarnado. Porque a Rodolfa, a personagem interpretada pela Ana, quando se espanta, põe na cabeça esse balde, que traz sempre dentro da mochila. E, quando pensa,  põe-se a roer um sapato — um sapato gigante e improvável. Tão improvável quanto pensar que num dia a Ana está a fazer rodas em cima do palco, a cantar rodeada de meninos e a fazer cócegas a um homem que só sabe cumprir horários e trabalhar (a tal ponto que chama Coisa, Coisinha e Coisinho à mulher e aos filhos), e noutro dia está num palco algarvio a contorcer-se de dores de parto, numa cena física e psicologicamente violenta d'A Cabeça Muda (texto de Cláudia Lucas Chéu, encenação de Rui Neto, dias 22 e 23 de Janeiro no Teatro das Figuras, em Faro). 

Como eu acredito em sapatos gigantes e improváveis — como não, se calço o 41? —, acredito que a Ana é capaz. Até porque já vi que é. PIM!


A Ana, a Joana Castro e o Ruy Malheiro.
O Mundo das Cores fica até 15 de Fevereiro 


sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

É p'ra meninos! (É então isto para crianças? Parte II)

É P'RA MENINOS. E meninas. E alguns senhores e algumas senhoras. Os que ainda não apagaram a luz da infância. Em suma: é p'ra supernovos. 

O primeiro dia do colóquio É ENTÃO ISTO PARA CRIANÇAS? (9 e 10 de Fevereiro, Fundação Calouste Gulbenkian) termina com o espectáculo É P'RA MENINOS. 

Para subir a um palco improvável da Gulbenkian, chamámos os supermaravilhosos Manuela Azevedo, Hélder Gonçalves, B Fachada e André da Loba. E eles vão cumprir o que prometem (para não ficarem de castigo):

No final de 2010, B Fachada edita o álbum É p’ra meninos. Poucos meses depois, os Clã lançam Disco Voador, canções para os supernovos. Neste concerto, estes dois projectos cruzam-se e partilham as suas experiências, dúvidas e inspirações ao se lançarem na aventura de fazer música para crianças. Às canções juntam-se ainda os "coros" dos objectos do ilustrador André da Loba.

Na manhã seguinte, a de 10 de Fevereiro, Manuela Azevedo e B Fachada participarão na mesa "É então isto uma canção?".

Até lá, vou-me entretendo com alguns dos sons, das imagens e das palavras que estes quatro supermaravilhosos gostam de partilhar com meninos e meninas, senhores e senhoras:


. a Manuela Azevedo gosta de partilhar o álbum Canções de Brincar, da Palavra Cantada;

. o B Fachada gosta de partilhar A Cigarra e a Formiga, de La Fontaine, e Os Três Porquinhos, de Walt Disney;

. o André da Loba gosta de partilhar o Codex Seraphinianus, de Luigi Serafini;

. e o Hélder Gonçalves gosta de partilhar os três álbuns de Soothing Sounds for Baby, projecto de música electrónica do americano Raymond Scott.

Para ouvir aqui, na íntegra, o volume I, de 1962. PIM!




quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

É então isto para crianças? — Parte I: Sentada no dorso de um leão.


Tanta culpa, tanta culpa, tanta, tanta, tanta, por ter deixado este meu blogue de porta fechada por uns tempos. Já tentei justificar-me com os bichos que me invadiram a casa — bichos feitos livros (e livros feitos bichos), sobre os quais prometi escrever aqui em breve. Cumprirei a promessa. Por agora, reabro a casa, que ficou desamparada como uma cabana de praia em dias de tempestade, para ir partilhando o que vai acontecer a 9 e 10 de Fevereiro na Gulbenkian. Anunciei-o aqui, no Facebook, quando saiu, na newsletter da Fundação Calouste Gulbenkian, a notícia sobre o colóquio É ENTÃO ISTO PARA CRIANÇAS?, que estou a comissariar a convite do Programa Gulbenkian de Língua e Cultura Portuguesas. 




Nos próximos dias, até o colóquio arrancar, darei pistas sobre o que lá se vai passar. Por agora, deixo parte do texto de apresentação que escrevi:


É então isto para crianças?
Criações para a infância e a juventude


É antiga a questão que dá título a este Colóquio: o que é afinal uma criação para a infância? Cria-se para ou será que o que é criado encontra naturalmente, na sua fase final e última, aquele a quem se destina?
Deste ponto parte o nosso Colóquio, propondo aos intervenientes e ao público uma reflexão sobre as motivações de um criador num momento em que as crianças ocupam, no espaço público, um papel central: quase todos os museus e teatros têm serviços educativos, os festivais de cinema e música apresentam secções destinadas aos mais novos, multiplicam-se as editoras que apostam em livros infanto-juvenis, assim como os escritores e ilustradores... O que se pretende transmitir às crianças com tantas actividades e com tantas possibilidades? Não será certamente apenas uma forma de as entreter. Talvez seja acima de tudo um modo de lhes revelar que, no que diz respeito à leitura do mundo, não há fórmulas nem manuais de instruções; e talvez seja ainda um modo de sublinhar a necessidade da partilha.
A partilha apresenta-se, pois, como o mote para estes dois dias dedicados à infância e à juventude. A partilha enquanto tópico problemático na infância: por um lado, à medida que se descobre o mundo, há uma necessidade de tudo partilhar, de comunicar; por outro lado, ao se adquirir a consciência de que o mundo e as suas coisas podem ser nossos, vai-se encarando a partilha como risco.
Assim sendo, propõe-se aos criadores reunidos neste Colóquio que tragam um livro, um filme, uma canção, em suma, uma criação para a infância que os tenha influenciado, para que, partindo dela, nos apresentem as suas respostas às perguntas que dão título a cada uma das conversas deste Encontro. Pretende-se com isto o cruzamento de vozes, a troca de experiências e modos de criar; em suma: a partilha.

A partilha. Foi talvez o maior tesouro que trouxe da infância, quando o meu Avô Zeca me passava a mão pelo braço, o punho cerrado se a história era a do Leão Velho, as unhas à gato se a história era a do Leão Novo. Cresci sentada no dorso de um leão. Com a imaginação à solta. PIM!