Um dos poemas do meu primeiro livro de poesia, As Coisas (ed. Abysmo), termina com este verso: "como uma coisa lenta em forma de espanto". O espanto sempre foi, para mim, uma hipótese de abrandar, uma hipótese de reparar, uma hipótese de regressar.
Até que levei o meu sobrinho A. ao Espaço de Mulheres (Clube Estefânia) para ver comigo a peça que a minha amiga Ana Lopes Gomes protagoniza: O Mundo das Cores (texto de Pedro Cavaleiro, encenação de Isabel Medina). Foi então que o espanto ganhou a forma de um balde encarnado. Porque a Rodolfa, a personagem interpretada pela Ana, quando se espanta, põe na cabeça esse balde, que traz sempre dentro da mochila. E, quando pensa, põe-se a roer um sapato — um sapato gigante e improvável. Tão improvável quanto pensar que num dia a Ana está a fazer rodas em cima do palco, a cantar rodeada de meninos e a fazer cócegas a um homem que só sabe cumprir horários e trabalhar (a tal ponto que chama Coisa, Coisinha e Coisinho à mulher e aos filhos), e noutro dia está num palco algarvio a contorcer-se de dores de parto, numa cena física e psicologicamente violenta d'A Cabeça Muda (texto de Cláudia Lucas Chéu, encenação de Rui Neto, dias 22 e 23 de Janeiro no Teatro das Figuras, em Faro).
Como eu acredito em sapatos gigantes e improváveis — como não, se calço o 41? —, acredito que a Ana é capaz. Até porque já vi que é. PIM!
A Ana, a Joana Castro e o Ruy Malheiro.
O Mundo das Cores fica até 15 de Fevereiro
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