quinta-feira, 26 de junho de 2014

Dentro da linha. Dentro de Eva. Dentro de bichos, nomes e frutos. Em suma: dentro da imaginação. E do tempo.

Faço compras online: compras de supermercado, compras de sapatos, compras de material escolar, compras de presentes, compras de roupa, compras de capas de telemóveis, compras de electrodomésticos, compras de colares, pulseiras, fios, anéis, compras de brinquedos, compras de bilhetes, compras de livros. Neste último caso, há que explicar que o faço sobretudo nos sites das próprias editoras ou em livrarias como a Letra Livre, por onde depois passo para levantar (e aumentar) a encomenda. À Amazon, por exemplo, resisto; tem um tamanho que intimida o meu pijama. Também compro pijamas online. Porque gosto muito de pijamas e de ir às compras - online - de pijama, sem sentir que alguém, algures, está a espiar-me, tirando notas relativas ao facto de ter falhado a combinação da parte de cima do pijama com a parte de baixo, sem sentir que alguém, algures, está a controlar o cesto das compras, a compará-lo com o saldo da minha conta bancária. Declarei recentemente o meu amor aos pijamas neste vídeo em que leio uma crónica do Nuno Costa Santos, incluída no livro Vou emigrar para o meu país:




Devo confessar que gosto ainda mais de fazer compras do que de pijamas. Prática, aliás, igualmente condenada pelos que dormem atirando os ares, em ritmo inspiratório-expiratório muito bem marcado, para um certo extremo do lado esquerdo. Lamento que haja quem despreze a experiência de estar confortavelmente instalado em flanela clicando ora no detergente para a roupa, ora nuns brincos Dior (quero estes). Perguntam-me as minhas amigas por que razão não quero eu sair de casa para ir às lojas. Por prezar o meu sossego, por detestar experimentar roupa em lugares exíguos por onde passam dezenas de pessoas, por 80% do meu corpo ser uma toca de bicho-do-mato, por existir online muito mais do que nas lojas, por haver sempre nos sites gigantescas secções outlet e artigos em promoção e artigos raros e artigos de todos os tamanhos. Perguntam-me as minhas amigas como é que acerto nos tamanhos. Muita experiência, muito olho e alguma dose de risco. Perguntam-me as minhas amigas se alguma vez tive problemas, se as coisas não corresponderam às expectativas. Em relação ao detergente para a roupa, tal pode ter acontecido. A nódoa ficou lá. No entanto, o shopaholic moderado (aquele que valoriza o sossego que é passar horas nas lojas online sem sair do sofá da sala, onde a única música autorizada é aquela que o próprio escolhe, onde não existem atropelamentos, nem cabides, nem balcões, nem filas de espera, nem empregados com humores variáveis) sabe que, mesmo que aqueles jeans comprados em 2003 tenham ficado ligeiramente largos, só a alegria de os ter recebido de pijama e de mãos estendidas para as mãos do meu fiel carteiro compensa qualquer excesso de tecido. 

É evidente que às vezes vou às lojas. Sobretudo quando estou fora de Portugal. E não tenho horários. Nem ando a correr. Por cá, gosto, por exemplo, de ir à Ler Devagar, na Lx Factory, por onde não passava há algum tempo, demasiado. Fui lá ontem para assistir à peça A Inexistência de Eva, com texto da minha boa amiga Filipa Leal e interpretação de outra amiga, a Ana Lopes Gomes, que, nunca desistindo de alcançar o impossível equilíbrio do feminino, partilha com o público o texto integral daquele que é um dos meus livros de poesia preferidos. Editado pela Deriva, que infelizmente suspendeu há dias a sua colecção de poesia, A Inexistência de Eva abre com um aviso: "Este livro foi escrito há muito tempo.". Assim se revela que este livro existiu sempre em quem o escreveu, esteve desde sempre inscrito na mão de quem o escreveu - uma mão de mulher, que conhece e intui a condição do feminino e vai tacteando esse território sempre novo e por descobrir. Para mim, é também um livro sobre a experiência da maternidade, se a tomarmos como experiência de criação - de nomeação, de (re)aprendizagem. 



E é também um livro sobre a infância, sobre a possibilidade de regresso, sobre a possibilidade de aproximação à origem, da sua preservação. Ora "ouçam" (e podem, de facto, ouvir os que forem ver a peça):



O livro começa assim - e é esta mulher que se encontra no palco, a desafiar o equilíbrio, a confirmar se tal coisa existe:



Esta é, pois, a sabedoria:



O único problema que enfrentei na Ler Devagar teve precisamente a ver com a realidade, a parte que aprendi a amar. Deparei-me com ele, com o problema, quando dei de caras com o expositor da literatura infanto-juvenil. Vim para casa carregada: "com o tempo", "estava a pensar" "em todas as coisas", como o "Herberto" (este e o outro, que agora se infiltra sempre, sem nenhum pudor, em todas as conversas...) ou "10 patinhos de borracha".


Estava a pensar..., de Sandol Stoddard e Ivan Chermayeff (ed. Bruaá)


E era em casa que me esperava um envelope da Loja Dada. Aqui ficam mais razões para eu fazer compras online: roupa linda, ilustrada e assim embrulhada. PIM!


Calções com gatos Beau Loves (aqui). Calças Indikidual (aqui e aqui).

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